A Crise da Pós-Verdade e o Resgate da Metafísica como Fundamento
A era da pós-verdade está se mostrando complexa e cheia de desafios. Essa situação apresenta riscos que vão além das simples opiniões, afetando a ciência, a ética, a política e a história da nossa sociedade.
Vivemos tempos em que é possível espalhar falsidades sem que isso seja considerado uma desonestidade. Palavras como “mentira” e “mentiroso” perderam seu peso. A desonestidade foi substituída por justificativas que tornam o engano mais aceitável, mesmo que isso cause confusão e desconfiança nas relações.
A pós-verdade se apoia em emoções e crenças pessoais, não em verdades objetivas. Ela nos pede para aceitar opiniões, mesmo que estejam distantes dos fatos. Essa transformação pode estar ligada a um esquecimento da importância da verdade, especialmente a que se fundamenta na metafísica.
O Engano Indolor: Dissimulação na Esfera Pública e Privada
Historicamente, as mentiras costumavam ser ditas com hesitação e um certo remorso. Hoje, muitas pessoas se tornam especialistas em criar razões para distorcer a verdade. Isso acontece principalmente por uma necessidade de liberdade, mas essa liberdade pode ser enganosa. A base desse comportamento é a pós-verdade.
A frase conhecida “Conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará” (João 8, 32) parece esquecer-se num mundo onde a verdade é deixada de lado. As pessoas já não se veem como mentirosas, mesmo diante de mentiras flagrantes. Comentários sobre a falta de clareza nas falas são mais comuns do que a aceitação de uma mentira.
Atualmente, a expressão “mentira” soa pesada e é evitada em conversas para não gerar conflitos. A ideia de causar dor ao chamar alguém de mentiroso é uma barreira nos diálogos. Como resultado, as palavras estão sendo moldadas para evitar qualquer responsabilidade. A verdade agora é tratada de maneira superficial, perdendo seu valor.
Esse problema se agrava quando a pós-verdade invade a esfera pública. Esse ambiente não apenas gera desinformação, mas assume um papel central na ciência e na política, complicando ainda mais as relações sociais.
O Antídoto Aristotélico: A Metafísica como Ciência da Verdade
Um meio de lidar com essa confusão contemporânea pode vir da metafísica aristotélica, que se define como “ciência da verdade”. Aristóteles afirmava que conhecer a verdade é conhecer suas causas. Para ele, verdade e ser são interdependentes, pois “cada coisa possui tanto de verdade quanto possui de ser”.
Essa verdade não é pessoal, mas universal, e deve ser encarada como a base para entender o mundo. Partindo de Aristóteles, Tomás de Aquino desenvolveu discussões profundas sobre verdade, propondo que, embora ninguém conheça a verdade de forma perfeita, todos têm algum acesso a ela.
Aquino explorou diferentes formas de se chegar ao conhecimento da verdade. Uma delas parte do complexo até o simples, enquanto a outra vai do simples ao complexo, buscando entender a totalidade das coisas. Isso nos ensina que a verdade é uma construção que requer esforço.
A Contribuição de Tomás de Aquino: Razão Especulativa e Realidade
Tomás de Aquino aprofundou a metafísica da verdade em várias questões. Em sua primeira, ele explica que embora a verdade pareça simples, o conhecimento dela é sempre um desafio. Portanto, a busca pela verdade é uma jornada repleta de dificuldades.
A alma humana se inicia na percepção sensorial e, a partir disso, busca elevar-se ao nível da abstração e do conhecimento. Essa ascensão é crucial para entender nossa realidade. A filosofia primeira, que é a metafísica, foca no estudo das causas primeiras e na busca pelo conhecimento mais puro e verdadeiro.
Aquino também diferiu entre a razão especulativa e a prática. Enquanto a razão prática busca a ação, a especulativa busca a verdade em si mesma. Isso reforça a ideia de que a metafísica deve ser considerada a ciência da verdade, dado seu foco nas causas essenciais.
Além dos princípios e processos de busca pela verdade, Aquino discutiu a importância do costume e das tradições. O que é habitual tende a ser mais aceito, mas isso não deve ofuscar a busca pela verdade real, que não deve ser confundida com meros hábitos sociais.
Essa busca é necessária para que possamos entender questões mais complexas e para que, por último, possamos aplicar esse conhecimento em diferentes campos. O jeito ideal de abordar uma disciplina não pode ser o mesmo para todos. Algumas verdades são imutáveis e, portanto, mais confiáveis.
Reconhecimento da Realidade como Base Contra o Caos da Pós-Verdade
Para lidar com a situação da pós-verdade, precisamos afirmar a importância de uma base real. Essa realidade deve ser reconhecida como primazia sobre a opinião pessoal. Isso nos protege do caos trazido pela desinformação e por uma falta de valores claros.
A pós-verdade reflete o esquecimento da metafísica e seus princípios. Isso pode resultar em graves riscos para a sociedade. Permite dissimulações de toda ordem, levando a um ambiente social prejudicial e enganador. Embora as mentiras proliferem, ninguém se considera mentiroso, tudo isso em meio a um cenário de forte apelo emocional que encoraja a distorção da verdade.
Esse cenário é ainda mais alarmante quando se observa que a pós-verdade adentra a esfera pública, alcançando ciência, ética, política e história. O retorno a uma visão metafísica mais sólida pode ajudar a restabelecer uma busca pela verdade. Essa perspectiva é fundamental para o entendimento do mundo, como defendido por Aristóteles e revisitado por Aquino.
A filosofia, quando aplicada corretamente, volta-se para o conhecimento da realidade, propondo um caminho contrário ao relativismo da pós-verdade. Essa busca não deve se basear em crenças individuais, mas na natureza das coisas. Precisamos nos lembrar que a existência é objetiva, e que as coisas são o que são, independente das opiniões acerca delas.
Em tempos de incertezas, o reconhecimento e o estudo da metafísica e da verdade se tornam essenciais para garantir uma base sólida. Essa busca pode levar a um entendimento mais claro das relações e da comunicação em nossa sociedade, essencial para garantir um futuro promissor.
