Comentário: Estudo do Imazon aponta territórios indígenas em maior risco de desmatamento como resultado do crescimento da atividade agrícola sob o acordo
A oposição foi feroz quando a União Europeia concordou com um pacto comercial com o bloco de nações do Mercosul em junho de 2019.
Eu estava entre os críticos que argumentaram que a redução de tarifas sobre bens importados para a UE do Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai alimentaria a demanda por commodities brasileiras que poderiam levar a um desmatamento adicional se as devidas salvaguardas não estivessem em vigor.
Nos 18 meses desde então, a oposição ao Acordo do Mercosul se intensificou, tanto na Europa como no Brasil.
De ativistas europeus a grupos indígenas brasileiros, e de países a parlamentos, houve indignação com o crescente desmatamento na Amazônia, juntamente com os incêndios devastadores que varreram a região por dois anos seguidos. Essas atrocidades ambientais ocorreram em conjunto com crimes sociais: como o Brasil tem testemunhado um número crescente de apropriações violentas de terras e assassinatos de um número recorde de Povos Indígenas.
Subjacente a esses eventos está o perigoso curso traçado pelo governo brasileiro, liderado pelo presidente Jair Bolsonaro, que reduziu as proteções ambientais do país e liderou propostas para abrir terras dos Povos Indígenas para uso comercial.
Mas quantos danos a mais o acordo com o Mercosul realmente pode causar?
O acordo – que levou 20 anos para ser negociado – ainda precisa ser assinado pelo Conselho Europeu, aprovado pelo Parlamento Europeu e depois ratificado pelos parlamentos nacionais dos estados membros da UE, e essa questão será central em suas deliberações.
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Dois estudos, um conduzido pela London School of Economics (LSE) para a Comissão Europeia, divulgado em julho, e um da Comissão Ambec para a França, publicado em setembro, identificaram o provável impacto negativo do acordo comercial.
Embora as estimativas variem entre os estudos, elas são claras de que a gravidade do impacto ambiental no Brasil aumentará sem uma abordagem efetiva das proteções ambientais e de direitos humanos no país. Um novo estudo de pesquisadores contratados pela ONG brasileira Imazon vai mais longe, sugerindo que outros especialistas subestimaram o impacto dos esforços no Brasil para enfraquecer as salvaguardas ambientais e minar os direitos indígenas às suas terras.
O novo estudo também pede Onde é mais provável que o desmatamento ocorra como resultado direto do acordo do Mercosul, com foco nas regiões brasileiras da Amazônia e do Cerrado.
Em última análise, os acordos de livre comércio repercutem nas comunidades locais: nas vidas individuais de homens, mulheres e crianças, e na destruição de trechos únicos de floresta e habitats que os cercam. Conhecer os territórios de maior risco de desmatamento em diferentes circunstâncias ajuda a fornecer os insights necessários para preveni-lo.
A equipe de pesquisa que o Imazon reuniu descobriu que muitas das áreas com maior risco de desmatamento devido ao aumento da atividade agrícola fazem fronteira com territórios indígenas. O desmantelamento das proteções para esses territórios tornará mais difícil do que nunca para as comunidades resistirem à invasão e ao desmatamento em suas terras.
O estudo também descobriu que o risco de desmatamento adicional é maior em áreas onde o desmatamento recente foi alto – especificamente as porções leste e sul do bioma Amazônia brasileira nos estados do Pará, Mato Grosso e Rondônia.
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É impossível separar o impacto que esse acordo comercial terá no Brasil, ignorando a influência de leis, políticas, padrões ambientais e governança. Assim, o estudo também pondera o impacto que o pacto comercial terá em diferentes cenários de governança política.
Meus coautores e eu descobrimos que sem fortes proteções contra o desmatamento e boa governança, a escala de desmatamento adicional no Brasil mais que dobra. Isso é um mau presságio para as florestas e os povos da floresta do Brasil, caso o acordo comercial avance como está escrito.
O estudo do Imazon acrescenta mais detalhes ao já convincente corpo de evidências sobre os impactos potenciais do pacto sobre as florestas e as comunidades que dependem delas para sua subsistência.
Para responder a estas preocupações, as relações comerciais da UE e dos países do Mercosul devem ser revistas insistir para que as empresas que buscam acesso ao mercado se comprometam a respeitar as normas internacionais sobre meio ambiente e direitos humanos. Para o efeito, o acordo deve incluir medidas robustas e executórias.
O Brasil está atualmente a caminho de perder suas próprias metas de política nacional de mudança do clima. Antes que a UE considere seu acordo comercial com o Mercosul, de qualquer forma, as tendências crescentes de desmatamento do país devem ser revertidas e as taxas alinhadas pelo menos com as próprias metas do país.
Nas palavras de Kretã Kaingang, da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB): “Temos que deixar claro, quando as florestas queimam, perdem-se vidas indígenas. Este tratado aumenta as ameaças às nossas vidas, à nossa cultura e modo de vida. Este acordo trará fogo, destruição e mais madeireiros ilegais para nossos territórios”.
Paulo Barreto é pesquisador sênior do Imazon, organização independente sem fins lucrativos sediada no Brasil que promove a conservação e o desenvolvimento sustentável na Amazônia