O governo publicou um plano para o uso ‘sustentável’ do carvão que permitiria a queima do combustível fóssil até 2050

    O governo brasileiro anunciou que quer quase US$ 4 bilhões em investimentos em mineração de carvão, apesar dos apelos internacionais para eliminar gradualmente os combustíveis fósseis mais poluentes.

    O Ministério de Minas e Energia publicou um “programa de uso sustentável do carvão mineral nacional”, que visa alavancar US$ 3,9 bilhões em investimentos em carvão nos próximos dez anos. Ele apoiaria o setor de carvão nos estados do sul do Brasil até 2050.

    O ministério diz que o dinheiro será usado para modernizar e fornecer incentivos às usinas termelétricas a carvão do Brasil e pode criar 600 empregos nas operações de mineração. Ele acrescentou que as reservas de carvão da região sul podem fornecer 18,6 GW de energia ao longo de 100 anos.

    O programa foi lançado no mesmo dia de um importante relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), que descobriu que as temperaturas na América do Sul devem aumentar a uma taxa maior do que a média global e antecipou uma frequência crescente de extremos de calor na América do Sul. a Amazônia.

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    O secretário-geral da ONU, António Guterres, disse que o relatório deve ser um “sentido de morte para o carvão e os combustíveis fósseis”.

    A ex-ministra do Meio Ambiente Izabella Teixera disse ao Climate Home News que a salvação do governo para o setor de carvão foi uma “grande surpresa” e descreveu o uso da palavra “sustentável” no título do programa como “uma piada”.

    Ela sugeriu que o governo de Jair Bolsonaro provavelmente havia sido pressionado pelo setor de carvão e queria apelar à base do presidente no estado produtor de carvão do sul de Santa Catarina.

    “Parece um lobby para ‘preservar o quintal’ e dar uma resposta política aos apoiadores brancos de Bolsonaro em [Santa Catarina]”, ela disse.

    A eleição de 2018 mapeada. O apoio mais forte a Bolsonaro está no verde mais escuro. (Foto: Geografia Eleitoral)

    O principal apoio de Bolsonaro em 2018 foi maior entre os ricos, os brancos e o sul do país, que inclui Santa Catarina, onde a população é mais branca e mais rica que a média.

    O presidente de extrema-direita está atrás nas pesquisas antes da eleição presidencial do ano que vem e está tentando minar a legitimidade da eleição, de uma forma que muitos analistas dizem espelhar seu aliado Donald Trump.

    O apoio ao carvão vai diretamente contra a pressão da presidência italiana do G20 e do anfitrião da Cop26 do Reino Unido para que o grupo de nações, do qual o Brasil é membro, concorde em sair do carvão.

    O chefe da Cop26, Alok Sharma, se reuniu separadamente com ministros brasileiros e ativistas ambientais na semana passada, mas não com Bolsonaro.

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    Sharma disse repetidamente que Cop26 tinha que ser o momento que “transferia carvão para a história”.

    Roberto Kishinami, líder de energia do Instituto Clima e Sociedade (ICS), disse que a decisão de apoiar o carvão mostra que a ONU errou ao incluir o ministro de Minas e Energia, Bento Costa Lima, como um de seus “campeões da transição energética”. “O ministro promove a transição de um país para dois séculos atrás”, disse.

    https://www.youtube.com/watch?v=kiSVOS0RtFcEm

    O analista de carvão do think tank Ember, Dave Jones, disse: “Esse é um movimento bastante descarado do Brasil apenas para ignorar todo o impulso internacional sobre o carvão. A dependência do Brasil da produção de carvão é muito pequena em comparação com sua produção de petróleo e gás, mas se o governo não consegue nem ler as folhas de chá no carvão, isso não é um bom presságio para o clima.”

    Brazil IEA

    O Brasil obtém apenas 3% de sua eletricidade do carvão (Foto: IEA)

    A grande maioria da eletricidade do Brasil é produzida por energia hidrelétrica, com apenas 3% vindo de carvão, alguns dos quais são importados.

    O ex-ministro do Meio Ambiente Teixera disse que, no longo prazo, “os produtores de carvão sabem que não há futuro e, para jogar como backup da segurança energética, o gás natural será o único”… não o carvão.

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    Giselle Wagner é formada em jornalismo pela Universidade Santa Úrsula. Trabalhou como estagiária na rádio Rio de Janeiro. Depois, foi editora chefe do Notícia da Manhã, onde cobria assuntos voltados à política brasileira.