Ricardo Salles é alvo de duas investigações policiais sobre conluio com madeireiros que derrubam ilegalmente a floresta amazônica

    Meses depois de ser acusado de conspirar com madeireiros ilegais da floresta amazônica, o ministro do Meio Ambiente brasileiro Ricardo Salles deixou o cargo.

    Ambientalistas comemoraram a saída de Salles, mas perguntaram por que o presidente Jair Bolsonaro demorou tanto para dar o empurrão. Seu substituto, Joaquim Leite, é um aliado e Bolsonaro continua a favor da abertura da floresta amazônica para os negócios.

    Salles é ministro do Meio Ambiente desde que Bolsonaro chegou ao poder em janeiro de 2019. Nesse período, a taxa de desmatamento na Amazônia brasileira aumentou.

    Claudio Angelo, da ONG Observatório do Clima, disse: “Salles foi certamente um sintoma desagradável, mas sua remoção deixa a doença intocada: Jair Bolsonaro é o principal formulador da política brasileira de desmantelamento ambiental, e isso permanecerá essencialmente o mesmo até o último dia do seu governo”.

    Em abril de 2021, o principal policial federal da região do Amazonas, no Brasil, acusou Salles de ter feito “uma parceria” com o setor madeireiro “na tentativa de obstruir a investigação de crimes ambientais”.

    No mês seguinte, o Supremo Tribunal Federal ordenou que a polícia investigasse Salles. Eles vasculharam os registros bancários e fiscais de Salles e descobriram “transações suspeitas”, incluindo um “movimento extremamente atípico” de R14 milhões (US$ 2,6 milhões) envolvendo o escritório de advocacia de Salles, de acordo com reportagens da mídia nacional.

    Salles se recusou a entregar seu celular à polícia, desafiando uma ordem judicial. A investigação está em andamento e Salles negou qualquer irregularidade, dizendo que a investigação foi “desnecessária” e “exagerada”.

    Na terça-feira, Bolsonaro elogiou Salles, dizendo: “O casamento da agricultura e do meio ambiente foi quase perfeito. Parabéns, Ricardo Salles. Não é fácil ocupar seu ministério.”

    Mas no dia seguinte, Salles renunciou. A revista brasileira Veja informa que a Suprema Corte estava prestes a liberar uma “bomba” em sua investigação e Salles pode ter sido obrigado a enviar seu celular às autoridades americanas para desbloquear sua senha. A organização Salles é acusada de conluio com madeira ilegal contrabandeada para os EUA.

    Ambientalistas disseram que Leite, que teria sido nomeado por recomendação de Salles, tem opiniões semelhantes às de seu ex-chefe.

    A ex-ministra do Meio Ambiente Izabella Teixera disse ao Climate Home News: “Ele é um homem que vem do setor agrícola – não tem experiência em instituições ambientais e também se juntou a Salles para discutir mercados de carbono”.

    Claudio Angelo, da ONG brasileira Observatório do Clima, o chamou de “um cowboy do carbono com laços estreitos com o agronegócio que dificilmente mudará alguma coisa”.

    Carlos Rittl, pesquisador brasileiro do Instituto Potsdam, disse que “tem raízes no mesmo ruralismo arcaico de onde veio Salles, que olha as florestas e os moradores da floresta com olhos do século XVII: como obstáculos a serem tirados do caminho”.

    Um pátio de madeira e uma doca na Amazônia. Não há nenhuma sugestão de criminalidade por aqueles retratados. (Foto: Greenpeace/Daniel Beltra)

    Embora a política ambiental interna do Brasil não deva mudar, Teixera disse que Leite teria menos poder do que Salles e que o Ministério das Relações Exteriores provavelmente ganharia mais controle sobre as negociações climáticas.

    Sob pressão do centro político, Bolsonaro recentemente substituiu seu ministro das Relações Exteriores, negador do clima, Ernest Araujo, por um diplomata de carreira Carlos Alberto França, que tentou reintegrar o Brasil a organizações multilaterais como a ONU.

    Liderada por Salles, a equipe de negociação climática do Brasil bloqueou o progresso nas negociações para estabelecer regras comuns para os mercados de carbono na última conferência climática da ONU em Madri, Espanha, em 2019, recusando disposições que impediriam a dupla contagem de reduções de emissões.

    Enquanto na cúpula, Salles trollou colegas delegados por twittando uma foto de um prato de carne “para compensar nossas emissões de Cop”. A demanda por carne bovina é um dos principais impulsionadores do desmatamento da Amazônia, já que as árvores são derrubadas para a pecuária.

    Segundo a Veja e o Guardian, as polêmicas conversas entre o Departamento de Estado dos EUA e o governo brasileiro foram suspensas após o anúncio da segunda investigação sobre Salles. O Departamento de Estado disse ao Climate Home News na sexta-feira passada que as negociações estavam “continuando”.


    Giselle Wagner é formada em jornalismo pela Universidade Santa Úrsula. Trabalhou como estagiária na rádio Rio de Janeiro. Depois, foi editora chefe do Notícia da Manhã, onde cobria assuntos voltados à política brasileira.